segunda-feira, 3 de novembro de 2025

UMA PRANCHA DE SURFE NO INTERIOR

 

Alice e Marina eram amigas inseparáveis e moravam numa cidadezinha do interior. Lá, a terra era tão seca que as nuvens tiravam férias.

A irmã mais velha de Alice vivia numa cidade maior, perto da capital. Não se sabe exatamente por quê, mas Alice acabara de ganhar de sua irmã uma prancha de surfe novíssima e superradical! Mesmo morando no interior, a menina estava tão feliz que andava com a prancha debaixo do braço até para buscar o pão, só para sentir o “clima de praia”.

Marina, por sua vez, estava de passeio marcado para o Rio Tucunaré, que, embora fosse divisa entre Estados, não era tão grande assim. Ninguém nunca contou ter visto ondas naquela correnteza.

Vendo a prancha de Alice, seus olhos brilharam com a ingenuidade típica de quem nunca viu o mar:

— Amiga, me empresta essa beleza! Vou dominar as águas turbulentas do Rio Tucunaré! — implorou Marina, fazendo a cara do Gato de Botas.

Alice fez drama:

— Ai, Marina, esta prancha é o meu xodó, meu portal para o Havaí mental... Mas, o.k., se você prometer que vai devolvê-la inteira, sem um arranhão de capivara, será sua!

— Promessa mais que prometida, amiga! – exclamou Marina.

No fim de semana esperado, a família de Marina chegou ao Rio Tucunaré. Léo, o irmão de 14 anos, que tinha a coordenação motora de um poste e a autoconfiança de um surfista profissional, olhou para a prancha.

— Ah, mas vai ser agora que vou inaugurar o Surfe de Tucunaré! — gritou ele, correndo com a prancha na direção do rio.

A mãe tentou avisar:

— Léo, cuidado! A prancha é empres...!

CRACK!

Com um salto cinematográfico digno de um trampolim de concreto, o menino aterrissou na prancha, que não aguentou o impacto da gravidade combinada com a densidade óssea do adolescente! O som foi de um tsunami de tábua, partindo-se em dois pedaços perfeitamente simétricos. Léo, ileso, ficou de pé em um pedaço, parecendo um náufrago em dois mini-botes, enquanto a água do rio engolia o resto.

Dona Maria, a mãe, sentiu a carteira tremer e levou as mãos à cabeça, com um grito que espantou até os peixes:

— Léo, você destruiu o sonho da Alice! Como vou contar para a dona Irene?!

Seu Nivaldo, o pai, um gênio da improvisação sob pressão, teve a ideia mais brilhante da década:

— Calma! Já sei! Nós vamos comprar essa prancha!

Foi então que ligaram para Alice. O pai, com uma voz cheia de entusiasmo falso:

— Alice, minha querida! A prancha foi um SUCESSO ESTRONDOSO! Passamos o fim de semana rindo, flutuando, fazendo acrobacias... Foi tão especial que decidimos comprá-la! Quanto você quer?

Alice, que estava sonhando em surfar não se sabe onde, respondeu:

— Ah, que bom que gostaram! Mas, senhor, eu não vendo! Essa prancha é minha relíquia, minha conexão cósmica com o mar!

A negociação virou um cabo de guerra telefônico: a família de Marina implorando para “comprar” o objeto que nem existia mais e Alice irredutível, recusando-se a vender o seu xodó.

Foi quando Dona Irene, a mãe de Alice e Rainha das Galinhas Caipiras da região, pegou o telefone:

— Escute aqui, Dona Maria, eu sei que a minha filha é cabeça-dura, mas eu estou precisando de umas aves novas para a criação – qual o seu preço em galinhas?

Dona Maria, aliviada, se entregou:

— Dona Irene, por essa prancha que nos deu tanta alegria, a senhora pode escolher as três melhores galinhas caipiras que eu tenho no sítio, as mais gordas entre as poedeiras, as que têm nome!

E assim, a prancha de surfe, que nunca viu uma onda de verdade, foi oficialmente trocada por três galinhas caipiras de elite. Alice ficou triste, mas foi consolada pela mãe, que cochichou:

— Uma prancha de surfe não bota ovo, minha filha! Essas três galinhas vão nos sustentar por um mês!...

E esse foi o final épico da aventura de uma prancha de surfe no interior: aposentou-se no Lixão, e as galinhas, rebatizadas de Alice, Marina e Prancha, viraram as novas estrelas do galinheiro de Dona Irene!...




 

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

A GUARDIÃ DO QUINTAL

 


A GUARDIÃ DO QUINTAL

No quintal da casa, em terreno sagrado,
habita a Nina, de olhar afiado.
Vira-lata preta, de porte altaneiro,
presença fiel no chão do terreiro.
 
Seu pelo reluz como noite sem fim,
brilhando à luz do sol do jardim.
Com saúde de sobra e patas ligeiras,
patrulha, bem firme, todas as fronteiras.
 
Com garras à mostra e olhos atentos,
defende a família em todos os momentos.
Ninguém vai ousar cruzar o portão
sem o julgamento da sua inspeção.
 
Barulho de pratos ou cheiro de osso,
ela já fica atenta e late mais grosso.
Com olhos de drama, atriz consagrada,
pede carinho com pose ensaiada.
 
E quando as meninas correm a brincar,
a Nina se apressa para acompanhar.
Senta-se nos pés, faz barricada:
não quer que a festa seja encerrada.
 
Late baixinho com carinha linda:
“Já vão embora? Não me deixem ainda!"
Entre risos e sol, ela é sentinela:
vigia e brinca, valente e bela.
 
É mais que uma amiga, Nina é guardiã,
muito inteligente, toma o sol da manhã.
Companheira fiel, faz sua vigília,
protege seu lar e ama a família!

"TIGRONÇA"

 

“TIGRONÇA”

 

Num canto da rua, sofrida e sozinha,

jazia uma gata, tão fraca e magrinha...

Com ossos à mostra, olhar de aflição,

miava baixinho, pedindo atenção.


Aninha, passando, parou sem pensar,

sentiu no seu peito o amor despertar.

Implorou à mamãe, querendo adotá-la –

em tal situação não podia deixá-la.

 

A mãe, relutante, pensou: “Já são três…”,

mas viu nos olhinhos da filha a altivez.

Cedeu com suspiro e o coração apertado –

sabia que a gata inspirava cuidado.


A Lolla chegou com sombra e suspiro,

mas logo ganhou alimento e alívio.

Tomou seus remédios, dormiu no calor

de braços que, agora, lhe davam amor.

 

Ganhou peso logo, estava curada,

correu pela casa, e muito animada!

O pelo amarelo brilhou feito sol,

com listras e pintas num belo arrebol.

 

Virou a “tigronça”, felina contente,

com jeito de onça e tigresa valente.

Um ser transformado, feliz e encantada,

vivendo em família, cuidada e amada.

 

E Aninha, orgulhosa, sorri todo dia,

pois sabe que o amor é pura alquimia.

Lollinha sofreu, mas isso é passado,

pois hoje, ela tem o lar tão sonhado!

O XODÓ DE MARIA


O XODÓ DE MARIA

 

A menina o conheceu quando ele estava internado,

peludo, encolhidinho, com seu olhar assustado.

E assim foi que sua sorte, felizmente, já mudou,

pois, logo, a doce Maria por ele se apaixonou!

 

Ninguém sabia seu nome, ele não tinha tutor;

com seus miados, pedia um lar que lhe desse amor.

Aquela linda menina tinha um coração bom:

quis levá-lo para a casa e lhe deu o nome Tom.

 

Tom é um gato tranquilo, companheiro da Maria.

Quando eles estão juntos, vê-se pura sintonia.

Ela o embala no colo, ele fica confortável,

dorme num canto da cama esse bichano adorável.

 

Quando ele está na calçada, seu pelo reluz ao sol,

encantando a quem passa, como se fosse um farol.

Essa beleza felina tem pelagem tão sedosa

que uma menina falou: “Olha, é uma raposa!”

 

A mãe dela riu baixinho, explicando com doçura:

“É um gato, minha filha, toda essa belezura!”

Tom não dá nenhum trabalho, só afeto e mansidão,

um bichano muito amado que aquece o coração.

 

Sua família o adora, a vizinhança também —

esse príncipe felino só sabe fazer o bem.

E Maria, a menina, com o Tom vive feliz:

ele é o seu xodó, tudo o que ela sempre quis!

 

O VALENTE GUARDIÃO


O VALENTE GUARDIÃO
 
Chiquinho é cachorro pinscher de fama bem conhecida:
magricela, nervosinho e de voz bastante ardida.
Todos dizem que é chato, invocado até demais,
mas quem conhece já sabe: é só aparência, rapaz!
 
Ele é pequeno no porte, gigante no coração,
tem olhar de sentinela e faro de um furacão.
Ele convive com gatos – sim, com toda a simpatia!
Ronronam no mesmo canto em perfeita harmonia!
 
O seu mundo gira em torno de uma menina, a Aninha,
a quem guarda com coragem e, ao seu lado, caminha.
Se alguém ousa se achegar, mesmo com todo o cuidado,
vai tomar um grande susto com seu potente rosnado!

Inteligente e sensível, a tudo presta atenção,
tem audição apurada e excelente visão!
Ele dá seu maior show quando outros cães aparecem:
não importa o tamanho, todos eles estremecem!
 
Já foi visto espantando um grandão ali na rua,
que correu igual ao vento, quase foi parar na Lua!
É que esse valente pinscher tem a alma de leão:
não se mede um guerreiro só por sua dimensão.
 
A verdade é que o Chiquinho, mesmo com tanta doçura,
defende a casa e a menina com valentia e bravura.
Um anjo de quatro patas que, apesar desse furor,
domina com maestria a linguagem do amor!

CHAMADO DA TERRA

 


CHAMADO DA TERRA

 

Na infância, os pés descalços correndo em chão de poeira

subiam o tronco das árvores, fugiam além da porteira.

Mas veio o brilho das luzes, janelas de arranha-céu

que deixaram para trás seu cavalo e seu chapéu.


Na juventude, o mundo chama: ruas, praças, ambição:

quer-se tudo, quer-se longe, como quem foge do chão.

Mas o tempo, sábio e calado, semeia silêncio e saudade,

e, um dia, em meio ao ruído, desperta a voz da verdade:

 

“Você pertence à terra, ao cheiro do mato molhado,

ao mugido que vem do campo, ao céu vasto, estrelado.”

Então, a alma cansada anseia por menos vitrinas,

por mais raízes e vento, por galos ao som das matinas.

 

Voltar não é retroceder – é se lembrar do que se é:

carne do barro do mundo, poeira, semente e fé.

O ser humano é da terra, não das torres nem do aço:

cedo ou tarde, ela chama, e ali renasce o abraço…


UMA PRANCHA DE SURFE NO INTERIOR

  Alice e Marina eram amigas inseparáveis e moravam numa cidadezinha do interior. Lá, a terra era tão seca que as nuvens tiravam férias. ...