domingo, 26 de dezembro de 2021

O HOMEM QUE CHOROU NA PRAÇA*


    Era a tarde de um domingo do mês de novembro. A cidade já estava enfeitada para o Natal. Presépio, trenó e casinhas temáticas faziam parte da decoração natalina da praça central.
    O sol brilhava no céu azul, e as nuvens de algodão passavam suavemente, levadas pela brisa refrescante.
    A praça estava quase vazia quando a família chegou. Apenas um homem ocupava um daqueles bancos de concreto que estampam nomes de empresas da cidade.
    As meninas correram para ver de perto cada decoração e faziam poses para as fotos que o pai tirava com o celular. O homem que estava sentado tentou falar com ele, mas o pai logo pensou ser alguém pedindo esmolas para a bebida ou para outros fins nada saudáveis. Fez de conta que não ouviu e continuou acompanhando as crianças. O homem insistiu:
    — Por favor, me ajude! Não estou pedindo dinheiro... – dizia com os olhos marejados.
    A mãe, que tinha ido ao banco, foi se aproximando, mas antes que se juntasse à família, também foi abordada pelo homem:
    — Moça, será que você pode me ajudar?
    Nesse momento, uma das filhas chamou a mãe para ver o presépio.
    — Só um instante. – ela respondeu ao homem.
    Aproximou-se das filhas e contemplaram o presépio. O homem continuou olhando para ela e dizia:
    — Ela vai me ajudar!
    Quando a mãe voltou-se para lhe dar atenção, percebeu que o homem estava tomado por uma grande tristeza que o fazia chorar. Então, ele apontou para o trono que havia em uma das casinhas e disse:
    — Eu só quero uma roupa de Papai Noel... Quero me sentar lá para fazer a alegria das crianças!
    Surpresa e comovida com o pedido, a mãe fez um movimento para pegar a carteira na bolsa, mas ele imediatamente lhe disse que não queria dinheiro. As lágrimas rolavam pelo seu rosto abatido enquanto ele balbuciava:
    — Desculpe... Estou pedindo essa roupa porque a lembrança do meu filho fica bem mais forte perto do Natal...
    — Não precisa se desculpar. – disse a mãe.
    — Meu filho tinha três anos quando eu o perdi... Já faz dezessete anos que ele se foi, mas parece que ainda ouço a sua voz me pedindo para ver o “Papai-éu”...
    — Puxa... Sinto muito! O que aconteceu com ele?
    — Ele teve endocardite... – respondeu baixando a cabeça.
    — Que triste! Sinto muito! Quero ajudar o senhor, sim. Espere aqui que vou ver se encontro alguma loja aberta.
    — Obrigado! Nem que seja só a barba e o gorro, já está bom para mim...
    Em seguida, a família se dirigiu até a rua principal do comércio. Coincidência ou não, em pleno domingo, estava aberta uma das lojas de presentes e utilidades domésticas. Sem muita certeza de encontrar o que procurava, a mãe desceu do carro com a filha mais velha. O coração de ambas estava ansioso pela expectativa de realizar um desejo tão bonito do homem que chorava na praça. A alegria tomou conta delas quando a vendedora disse que havia o traje completo de Papai Noel!
    — Pode embrulhar para presente, por favor. – disse a mãe.
    A menina aproveitou e perguntou à mãe se podia escolher alguns enfeites para a árvore de Natal que ela ia montar em casa.
    — Claro, filha! Só não demore, porque ainda precisamos levar a roupa do Papai Noel.
    Depois que mãe e filha saíram da loja, a família voltou para a praça. Sentado no mesmo banco, o homem girou a cabeça ansioso, acompanhando os movimentos do carro parando no estacionamento.
    A filha mais velha quis acompanhar a mãe e fez questão de entregar o presente. O homem se debulhou em lágrimas e não parava de dizer:
    — Obrigado! Obrigado! Que Deus abençoe vocês! – ele abraçou a menina e chorou copiosamente.
    A mãe sentiu um nó na garganta, e seus olhos ficaram mais umedecidos. Com o rosto ainda molhado, ele perguntou à menina:
    — Você vai voltar aqui à noite para ver o Papai Noel?
    — Vou, sim! – ela respondeu.
    Mãe e filha se despediram do homem com o coração em paz, leve e feliz.
    Acima do céu azul, não havia brisa refrescante, mas a temperatura estava agradável. No meio do jardim, as nuvens de algodão formavam um tapete macio e aconchegante. O menino corria atrás das borboletas quando foi chamado por alguém:
    — Venha cá, Davi!
    Um homem estava sentado sobre o tapete, abraçou o menino e apontou para baixo:
    — Veja só quem está feliz!
    Davi sorriu com ternura ao ver a alegria do homem que chorou na praça. E o Homem que chorou na cruz também sorriu, espalhando sua luz por todo o jardim...

*Este é o primeiro conto de Natal que escrevi com base numa história real. Nunca havia escrito algo sobre o nascimento de Jesus, mas um acontecimento inesperado e aparentemente casual despertou em mim esse desejo. Para a ilustração, contei com a sensibilidade e o talento de Camila Scavazza, que representou muito bem a história com essa linda arte!

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